RESCALDO DAS URNAS Por Alberto Dines em 1/11/2010 |
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Quem matou Saulo? A mídia teria preferido discutir os sensacionais desdobramentos da telenovela Passione, da Rede Globo. Seria mais empolgante, mais proveitoso, mais divertido, menos complicado. Mas o calendário impunha a pauta eleitoral e os gênios do jornalismo sacaram do coldre a única arma que sabem manejar – embora canhestramente: o denuncismo. Se nossa mídia fosse mais diversificada e, portanto, mais capacitada para exercer uma vigilância permanente sobre os demais poderes, o presidente Lula teria sido contido tão logo iniciou a escalada ao longo da qual não apenas maculou a liturgia do cargo, como feriu valores democráticos justamente quando se processa a alternância do poder. O pronunciamento do presidente Lula minutos depois de votar na manhã de domingo (31/10), diante das câmeras e microfones do país inteiro, é uma síntese das infrações cometidas nos últimos sete meses e que só uma imprensa firme, serena e competente teria condições de coibir se soubesse fazer-se respeitar. Encerrada formalmente a campanha eleitoral, as urnas ainda abertas, o presidente da República confrontou arrogantemente a legislação eleitoral para atacar o candidato adversário e, ainda por cima, responsabilizá-lo pela inusitada intervenção da Santa Sé na soberania brasileira. Quem convidou o papa Bento 16 para imiscuir-se na vida de um Estado pretensamente laico como o nosso foi o próprio presidente Lula quando, em 2008, acompanhado por sua candidata, foi ao Vaticano para celebrar uma concordata que, graças a um conluio com a grande imprensa, manteve-se secreta por alguns meses para facilitar a sua tramitação pelo Legislativo. Rabo preso Uma imprensa que aceita essas cumplicidades casuais (ou sazonais) torna-se naturalmente vulnerável, desfibrada, perde a credibilidade e, quando tenta se afirmar, só consegue recorrer ao barulho das acusações de corrupção. Algumas foram consistentes – caso da indústria de favorecimentos operada pela ex-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra. A maioria das revelações, porém, é incompleta, fruto de investigações apressadas, às vezes irresponsáveis. A fiscalização da imprensa não pode ser exercida de forma espasmódica e seletiva. Quando um jornal como a Folha de S.Paulo hospeda e protege em suas colunas uma figura como o senador José Sarney – encarnação das aberrações produzidas pela concentração do poder político-econômico-mediático – perde a legitimidade para defender a liberdade de expressão. Uma imprensa respeitada não pode ter o rabo preso nas malhas de qualquer poder. Uma imprensa respeitada precisa apresentar-se com seriedade e gravidade. Ao conviver com tantas banalidades, desperdiça suas convicções. Vida política O mito Lula foi criado e mantido pela imprensa desde quando o líder sindical do ABC paulista surgiu no noticiário, na segunda metade dos anos 1970. A imprensa estava certa no seu afã de ativar a derrocada do regime militar e reativar a vida política. Mas para preservar este mito Lula, sobretudo depois de alçá-lo à Presidência da República, a imprensa deveria ter sido mais severa quando seus arroubos se converteram em transgressões, justo no momento em que lhe cabia presidir com isenção a escolha do seu sucessor. Desta pusilanimidade da imprensa resultou o mais virulento processo eleitoral desde a redemocratização. A vida política e institucional de um país não pode ser balizada pela dramaturgia das séries televisivas. O “vale tudo” que precisa ser evitado está muito além da dúvida sobre quem matou Odete Roitman.
veja a íntegra no http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=613JDB017 |
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